O projeto está à mesa. Melhor em uma comissão formada por membros do Conselho de Orientação e Fiscalização (COF) da Associação Portuguesa de Desportos. E agora chegou o momento de bater o martelo.
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Em meio a tantas informações sobre a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) na Lusa, há quem levante a sobrancelha, olhe de soslaio e quem efusivamente comemore, alegando que esse é o caminho. Mas vamos lá… Vou desenferrujar meus 15 anos de jornalismo econômico e analisar, com a devida equidistância, o que temos por aí a respeito desse projeto na Portuguesa.
- Ponto 1: O projeto SAF na Lusa conta com 3 investidores. A saber: Grupo Águia, SportsHub Brasil e Lion Capital, segundo apuração do competente jornalista Luiz Nascimento;
- Ponto 2: O imobiliário, pelo que dá para entender, é a joia da coroa;
- Ponto 3: Investimentos no futebol.
Não vou esticar muito a prosa em direção a outras inflexões, porque sinceramente esses três já dão um bom pano para a manga. Dito isso, vamos direto ao cerne: Qual é o valor da marca Portuguesa, o famoso “valuation”? Lembrando que valuation é um termo usado por bancos de investimento na hora de fazer a conta sobre quanto vale o ativo em negociação. É um número poderoso nesse tipo de operação.
Só que aqui, tenho ressalvas quanto ao entendimento. O valuation não se restringe à marca. Ele engloba todos os ativos pertencentes à negociação.
Então, penso que deveria contemplar a parte da área onde está sua sede social, porque há uma significativa parcela que pertence à Prefeitura de São Paulo e é cedida em regime de comodato, se nada foi alterado nesse caos em que o clube viveu nos últimos anos. Depois, há o Centro de Treinamento, outra área que também foi cedida pelo Governo do Estado de São Paulo, além de direitos federativos e econômicos de atletas. Esse é o grosso do ativo da Portuguesa, ou seja, alvo de avaliação por quem deseja arrematar a Lusa no molde SAF.
Feita ponderação, vamos ao que temos à mesa. Em recente entrevista ao podcast Futeboteco, o presidente do clube, Antonio Carlos Castanheira, indicou que o “valuation” da marca gira entre R$ 80 milhões e R$ 110 milhões. Ok. Dito isso, vamos tomar pelo copo mais cheinho: R$ 110 milhões.
Lado a lado desse valor está o tamanho da dívida da Lusa, que também no mesmo podcast, Castanheira apontou para algo ao redor de R$ 600 milhões. Ou seja, a dívida é seis vezes o valor da marca Portuguesa. Anote aí essa continha, ainda que incompleta, porque ela tem nome e chama-se múltiplos.
Se levar só isso em conta, posso afirmar tranquilamente: é um negócio ousado. Isso para usar um adjetivo cordato.
Só que antes de avançar, tem uma outra sigla que precisamos colocar na equação. Chama-se EBTDA. Oriunda da língua inglesa, ela quer dizer ganhos antes de taxas, depreciações e amortizações. Contabilmente pode ser encarada como lucro operacional ou, no popular, geração de caixa.
Ok, ok, então, qual é a geração de caixa da Lusa? Cri cri cri… Não sabemos. Alô, cofistas, alguém sabe?
Parece um monte de nome escrito de maneira bonita, não é? Mas a qualidade da proposta passa pelos múltiplos da operação e a capacidade atual e futura de geração de caixa. É isso que vai definir se alguém comprou água no deserto ou metal com cara de ouro.
Geralmente, uma empresa endividada é considerada boa, quando seu passivo não supera mais do que 3 vezes a geração de caixa, o EBTDA aí de cima. Passou disso, a turma da Faria Lima já levanta a sobrancelha. E se a companhia tiver ação em bolsa, tenha certeza de que ela será olhada ainda mais de perto por analistas do mercado financeiro.
É bem simples, torcida lusa. Dinheiro não tolera desaforo.
Agora, já dá para ao menos começarmos a entender algo desse intricado jogo SAF na Lusa. Com esse múltiplo de seis vezes em termos de endividamento e valuation da marca – levando em conta o que já mencionamos acima, a ausência do valuation total –, faz sentido que seja um consórcio (ponto 1) a comprar essa SAF. Sozinho, ninguém vai topar o risco.
Depois, está evidente que adquirir a Lusa somente se torna algo aceitável se a parte imobiliária (ponto 2 acima) virar o alicerce inicial, INICIAL, da operação. Caso contrário, é quase uma operação suicida.
Porque o futebol (ponto 3) entrará inicialmente como “custo” por mais que a narrativa seja “investimento”. Investimento vai ter mesmo é na reestruturação da área imobiliária para que a geração de caixa futura, desenhada pelo consórcio se concretize e consiga fechar a equação dívida e compra. Qual seja: Arena para 20 mil pessoas, como se fala por aí, e espaço para eventos, entre outras ações patrimoniais.
Em suma, enquanto não soubermos como os ativos foram avaliados e qual é o múltiplo, não há como imaginarmos nada. Com a palavra, a comissão do COF.
* Maurício Capela é jornalista há 28 anos. Comentarista, já trabalhou em diversos veículos, como RedeTV!, 105 FM, Tropical FM, Veja, Valor, Gazeta Mercantil.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do NETLUSA