Zorzi: Brasília, as críticas de (e ao) Castanheira e o sentido de torcer

Lado financeiro pode compensar, mas ser torcedor vai além da lógica da administração: é normal que nos sintamos decepcionados

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Foto: Ronaldo Barreto/NETLUSA

“Cresci vendo inúmeros clássicos no Canindé”. Soa até irônico esse trecho da nota do Castanheira sobre a venda do mando contra o Corinthians para Brasília. Na assinatura, faz questão de colocar o status de torcedor à frente do de presidente. Acho que ele próprio sabe o tamanho da importância de um jogo importante como esse na formação de um torcedor.

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Dos meus amigos lusitanos mais próximos, reparei um sentimento de revolta. Olhando comentários em redes sociais do clube e de perfis que cobrem a Lusa, a grande maioria dos comentários é de frustração, tristeza, incapacidade, raiva. O pessoal que há algumas semanas estava ansioso pela volta à elite, parece não estar mais com tanta gana de torcer.

A venda de mando é uma atitude bastante arriscada, ao meu ver. Tem o lado financeiro, como destaca o clube, mas tem também a questão do clima com a torcida, que pode não ficar dos melhores nas próximas partidas. Reclamações, protestos, talvez os próprios jogadores acabem sendo ‘alvos’ das críticas.

Não é de hoje que a Lusa vende mandos, mas o caso atual ganha mais repercussão justamente pela falta dessa sensação de assistir a um clássico nos últimos oito anos. Pra muitos lusitanos, esse seria potencialmente o jogo mais especial do ano (caso não passemos de fase, o que parece bem provável). Deve ter pais e avós que sonham em levar os filhos pequenos a uma partida assim, e até hoje não conseguiram.

Por sinal, consta na justificativa oficial do clube que tratou-se de uma “proposta irrecusável” – sem saber quanto, não consigo dizer se concordo. Mas um ponto que me chamou atenção é que a nota diz que o valor “será fundamental para o pagamento das contas da dignidade da Portuguesa no Paulistão”.

Ou seja, se não existisse alguém interessado em comprar o mando, ou caso houvesse algum delito da torcida que resultasse em perda de mando nas rodadas anteriores, automaticamente não teríamos como sustentar essa dignidade?

Vejo com preocupação algumas das justificativas, porque abrem margem para a venda de mandos no futuro, também. Pensando no lado do dinheiro, é lindo vender mandos de jogo. Você continua com chances de ganhar a partida (como fizemos contra o Corinthians em 2013, por exemplo) e enche os bolsos. Dá pra jogar uma Série A vendendo mandos contra os times do Rio e São Paulo pro centro-oeste, norte, nordeste, pros times do sul pra Santa Catarina, e por aí vai. Mas tem um preço: afasta a torcida.

Quando a gente enxerga o futebol só pela ótica financeira, esquece o lado humano. Pelo lado da grana, há espaço no futebol para bizarrices como o Ipatinga, Guaratinguetá e Barueri, times que conquistaram espaço e formaram torcida levando o nome de suas cidades e depois foram simplesmente vendidos para outros lugares (Betim, Americana e Presidente Prudente).

Mas e um clube tradicional como a Portuguesa? Continua existindo e tendo alguma relevância, basicamente, pela torcida que tem. Pode não ser grande como tantas outras, mas a gente existe. E pra boa parte dessa torcida, a possibilidade de ir aos jogos é o que forma o elo que nos aproxima da nossa paixão.

A impressão que tenho quando vejo algumas das declarações do presidente cobrando a torcida é que elas parecem bem-intencionadas, mas mal-direcionadas. Quando se dá uma entrevista a uma rádio, ou canal de YouTube, ou nos canais oficiais do clube, na qual se critica a ausência da torcida, em quem esta declaração está chegando?

A Portuguesa deve ter hoje dezenas ou centenas de milhares de torcedores espalhados por aí, mas quem fica “antenado” no dia-a-dia do clube é um número bem menor. São sempre “os mesmos”. Os mesmos que vão ao Canindé, aos eventos no Museu do Futebol, em sessões de cinema, em jogos fora, que compram camisas e produtos oficiais, que ajudam como podem. Tem muita gente que é sócio-torcedor mais para ajudar o clube do que por benefício próprio.

Quando vêm as reclamações de baixo público, baixa adesão ao programa de sócio, o que nós podemos fazer para mudar isso? A crítica, que supostamente deveria ser para pressionar o torcedor mais afastado, simpatizante, a comparecer mais aos jogos, acaba dando uma certa sensação de impotência justamente ao pessoal que está mais presente.

Quem sabe no futuro vejamos essa decisão do Castanheira como corajosa e necessária, apesar de impopular. Nem só de decisões que agradam ao grande público se fazem boas gestões. O tempo dirá, mas, no momento, é direito nosso ficarmos tristes e revoltados.

Encerro a coluna de hoje com uma frase que ouvi da boca do presidente no Paixão Lusa: “Se eu tiver dois Castanheiras, ponho assim: o torcedor e o administrador. O Castanheira torcedor também está decepcionado.”

* André Carlos Zorzi é jornalista, autor de “Para Nós És Sempre O Time Campeão – A Portuguesa de 1996” e coautor de “Lusa: 100 Anos de Amor e Luta”.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do NETLUSA


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Luiz Gustavo - Santos/SP
Luiz Gustavo - Santos/SP
1 ano atrás

Belo texto, Zorzi. O que não é enxergado por alguns é que com atitudes como esta não haverá engajamento do torcedor ao programa de sócio-torcedor ou presença de mais público no estádio. A torcida vê mais dinheiro entrar, um time horrível ser montado, possível luta desesperada contra o rebaixamento e até o fantasma de voltar para a A-2 bem próximo. Os poucos recursos que temos no futebol são mal investidos. Este desrespeito vem de longe. Mesmo o OTD quando cobrado sobre reforços dizia que “o clube Portuguesa era rico, mas o time de futebol era pobre”. Não dava para contratar e vivia vendendo os destaques. Mesmo sem ser associado da Leões estive no meio deles várias vezes gritando “Fora OTD. Ditador do Canindé” (quando o estádio ainda se chamava “Independência”). Hoje temos um clube falido que só existe por causa do futebol. Talvez se tivéssemos montado times mais fortes, ganho títulos (que se eternizam, não são como o dinheiro que muitas vezes é mal gasto ou desviado) hoje contaríamos com uma torcida bem maior e consequente respeito da mídia e federações (que fazem o que podem para nos botar para baixo). Nós somos apaixonados pelo futebol de um clube que jamais teve este item como carro chefe. Mas amor é assim, cego e infinito. Apesar de tudo, “Salve a Lusa!!!”. Nós te amamos, Portuguesa!

Nelson
Nelson
1 ano atrás

FALOU TUDO LUÍZ GUSTAVO!

Novaes Lusa sempre!
Novaes Lusa sempre!
1 ano atrás

Não vamos ser tão dramáticos. Castanheira pegou o clube na bosta ! Quem fez mais do que ele nesses últimos 8 anos? Cobertor curto, cofre vazio, patrimônio destruído, dívidas trabalhistas e calendário limitado.Querem o que? Ah! tenha dó…
Nossa torcida não coloca nem 10 mil pagantes.
Gostaria de ver esse clássico e outros, mas necessitamos compreender a situação. Com passos curtos e firmes, iremos dar a volta por cima.
Agora, esse dinheiro tem que ser investido no futebol!!! Isso sim tem que ser cobrado.!!

Alexandre Mendes
Alexandre Mendes
1 ano atrás

Muitos “Nicks” novos defendendo o ACC, estranho nunca vi essa gente por aqui, será que concordam mesmo com a venda do mando ou estão fazendo lobby para ser um dos 200 sorteados?

Alex
Alex
1 ano atrás
Responder para  Alexandre Mendes

Tive a mesma sensação de nomes novos.

lusa veio
lusa veio
1 ano atrás
Responder para  Alexandre Mendes

sao corintianos,que vao poder assistir o jogo no conforto da sua casa,mas que tem uns pau mandados da diretoria aqui tem,com certeza esses ja conseguiram uns ingressos do sorteio

Rodrigo Antônio
Rodrigo Antônio
1 ano atrás

Essa nota divulgada pelo presidente é um dos maiores absurdos da história centenária da portuguesa. Somente um presidente que fez parte da diretoria de Alexandre Barros seria capaz de proferir tantos impropérios em poucas linhas. O vagabundo tem a coragem de escrever que vai vender o mando sim, e a culpa é da torcida, da bilheteria, do sócio torcedor, de todo mundo, menos dele. O rei da SAF. É presidente da portuguesa, um clube centenário, e descobriu hj que jogamos pra 2 mil pessoas. Tenha vergonha nessa cara. Vc nunca foi de arquibancada, vc nem sabe o que é arquibancada. Amiguinho de Alexandre Barros. Jogar copa Paulista contra o Corinthians b em Osasco, contra Atibaia em Indaiatuba, ali estava a porra da torcida. Agora, caga na mesma. Vagabundo. E aos vagabundos que vem aqui defender presidente, a arquibancada nos espera. Tenho orgulho de em 40 anos de canindé, nunca ter subido naquele elevador pra cadeiras cativas ou sei lá o que é. Torcedor é na arquibancada, o resto é um bando de político safado que defende marmanjo por interesses escusos. Tô puto. Presidente lixo.

Mauro Martins Pereira
Mauro Martins Pereira
1 ano atrás

Tb achei estranho, Alexandre e Alex, devem seu paus mandado sim…castanheirinhas…

Mauro Martins Pereira
Mauro Martins Pereira
1 ano atrás

Ser*

LUSITANO
LUSITANO
1 ano atrás

Castanheira traidor!!!! A entrevista e justificativa dada no “Paixão Lusa” foi patética!! Ele está cag… para o time…. tanto faz jogar A1 ou A2… é mais um picareta no comando do clube… mais do mesmo… Da Lupa, Lico, AB, ACC… bando de incopetentes….
CASTANHEIRA: VTNC!!!!!

Paulo Kasparian
Paulo Kasparian
1 ano atrás

Torcedor da Portuguesa parece que tem Alzheimer, esqueceram que Castanheira pegou o clube falido e junto uma pandemia.
Já fui diretor do social da Portuguesa e naquela época com bons ventos já era complicado levantar dinheiro, imagina agora.
Dê uma volta pelo Canindé aquilo parece mais a Síria depois de um bombardeio, administrações anteriores horríveis e Castanheira vem fazendo um ótimo trabalho colocando as contas em dia. Muito fácil criticar da arquibancada, vai lá e faça melhor.

Alexandre Mendes
Alexandre Mendes
1 ano atrás
Responder para  Paulo Kasparian

Primeiro ganhador
Só 199 agora para o sorteio

lusa veio
lusa veio
1 ano atrás
Responder para  Alexandre Mendes

kkkkk,essa foi de cair os culhoes,daqui a pouco entra mais aqui

Rodrigo Antônio
Rodrigo Antônio
1 ano atrás
Responder para  Paulo Kasparian

Deve ser difícil digitar enquanto lambe as bolas do presidente.

Alexandre Mendes
Alexandre Mendes
1 ano atrás
Responder para  Rodrigo Antônio

Hahahaha

Alex
Alex
1 ano atrás

Se o clube tá tão uma bosta assim, porque SEMPRE aparece gente querendo ser presidente???
Ahhhh VTNC c esse papo furado…só querem encher o bolso de dinheiro, que se Fod@ a torcida e o futebol.

Joaquim
Joaquim
1 ano atrás

Parece que tem gente fazendo jogo de alguma oposição, não é verdade?

Renatão
Renatão
1 ano atrás

Excelente texto! Parabéns!

Félix
Félix
1 ano atrás

Fazer o que né? Para pagar a folha salarial vende o mando para um parceiro que está injetando $1 milhão nos cofres lusitanos. Esse valor (se é mesmo verdade) não chegaria nem com estádio lotado. Eu também não concordo, pois gostaria de ver o clássico no Canindé, mas com o time que temos … melhor pagar os salários e torcer para passar de fase e assim encontrar os grandes no Canindé.

Luiz Carlos Pires de cotia SP
Luiz Carlos Pires de cotia SP
1 ano atrás

Não tem problema a lusa mudar o local do jogo contra o Corinthians, afinal é só um jogo e ele viu o lado financeiro que é bom , mas o bom mesmo é a lusa não apanhar do Corinthians perante sua torcida e que apanhe fora de casa então. Claro que queríamos lusa e Corinthians no Canindé como em outrora , mas eram outros tempos e o tempo mudou muita coisa na portuguesa de desportos ou Lusa do Canindé e daí essa mudança do local do jogo.

Jose angelo da Silva Silvério
Jose angelo da Silva Silvério
1 ano atrás

Sou do Interior de São Paulo e torcedor da portuguesa, vejo a lusa precisando de rendo e a torcida que reside em São Paulo não está indo ao estádio, lógico ingresso caro o futebol apresentado não é dos melhores, por isso essa venda de mando de jogo contra o Corinthians.
E ruim mas a portuguesa precisa pagar as contas, tem que fazer caixa. Tomara que um dia a LUSA volte a ser respeitada e se volte para a elite do futebol brasileiro de onde não deveria ter saído .
Esse é o desejo de um torcedor distante, de ITUVERAVA SP que sempre acompanha a LUSA