Tiago Cabral: Que Heavy Metal é esse?

Estreia da Portuguesa com derrota no clássico contra o Palmeiras acendeu o sinal de alerta no torcedor

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Foto: Ronaldo Barreto/NETLUSA

Havia uma expectativa para a estreia da Portuguesa no Paulistão. Antes de o jogo começar, a torcida, que compareceu em bom número ao Allianz, concentrava-se com a esperança de uma boa apresentação. A dúvida unânime que pairava no ar era qual seria o comportamento do time. Vitória ou empate não estavam no centro da discussão. O ponto principal era a que tipo de time assistiríamos em campo.

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Essa ansiedade foi impulsionada pelo longo espaço que tivemos na mídia para apresentação do novo projeto. O discurso do CEO, repetido como um mantra, insiste que o nosso DNA será próximo ao Heavy Metal do Liverpool da época de Kloop. Um futebol intenso, transição rápida, jogo direto e pressão alta. Inclusive, ressaltou que a escolha para comandar a nossa casamata era justamente por ter esse perfil.

Quem acompanha um pouco de futebol, mesmo sem entender o “tatiquês” e as entrelinhas dos discursos, sabe que implementar uma filosofia complexa como essa não é fácil. Principalmente em menos de 30 dias, tratando-se de uma equipe de série D.

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Esbarra-se em diversos aspectos. Começa pela falta de interesse de bons atletas em jogar pelo clube e passa por um mercado cada vez mais recheado pelo dinheiro das ligas nas divisões acima e pela burocracia para oficializar de o CNPJ da SAF. Uma empresa que em menos de 30 dias foi criada com cerca de 200 funcionários e uma torcida exigente.

Dentro de campo, a escalação ousada da Portuguesa foi um prato cheio para Palmeiras, que explorou muito bem a genialidade de Estêvão. Os primeiros 45 minutos pareciam uma extensão de Votuporanga ou do time de Dado Cavalcanti. O Heavy Metal transformou-se em uma mistura de fado bucólico com um grupo folclórico dançando um vira sem sair do lugar.

O primeiro gol nasce de uma falha na saída de bola, justamente um dos principais pilares dessa tal modernidade prometida, a construção de jogo a partir da defesa. Tentamos sair tocando a bola, erramos o passe e o atacante palmeirense surge livre, cara a cara com o goleiro (bola defensável). Ainda no primeiro tempo, a tragédia só não foi maior graças ao goleiro Rafael, que se redimiu da falha e segurou dois ataques perigosos.

No segundo tempo, o Palmeiras tirou um pouco o pé do acelerador. A Portuguesa teve mais posse de bola, mas manteve a mesma ineficiência. As mudanças do treinador foram meras substituições de atletas. Não houve inversão de posicionamento, não melhoramos a presença no meio-campo e o ataque continuou nulo.

A equipe foi dominada durante os 90 minutos. Apresentamos um time espaçado, com inferioridade numérica no meio-campo e defesa exposta. Criamos apenas uma chance, um chute torto de Maceió no primeiro tempo. Weverton, sequer precisou lavar o uniforme ao término da partida.

Fernando Henrique, camisa 5, perdido na bagunça tática, pouco combateu os meias palmeirenses. Nossos laterais sofreram com Rômulo e Estêvão, e nosso quarteto ofensivo nada criou. Henrique Almeida e Renan Peixoto, a contratação de dois milhões de reais da segunda divisão austriaca, mal paravam de pé. A cada bola esticada e dividida com a zaga palmeirense, os atletas caíam como se fossem atletas sub-15 jogando contra profissionais. Daniel Junior, promessa de ser o dono da camisa 10 e craque do time, estava em campo?

Os 2 milhões de investimentos mensais no elenco, a maior folha salarial fora os clubes da série A, deu sinais de déjà vu do sofrimento que passamos nos dois últimos anos com os elencos medonhos de Beto Cordeiro e Castanheira. A sensação é de que a pré-temporada em Porto Feliz, não serviu para muita coisa. Nenhuma das premissas do Heavy Metal deu certo. Não fomos intensos, não fomos rápidos, não conseguimos o jogo direto e muito menos pressionar o Palmeiras.

O futebol é complexo, mas muitas vezes exige o simples. Um time de série D, montado às pressas, que joga pela permanência na divisão, não permite tempo para utopias ou delírios filosóficos de conceitos de jogo. Gostaria que meu time fosse o Brasil de 82, o Liverpool do Kloop, a Holanda de 74, mas no final a realidade se impõe. Precisamos ser mais a Portuguesa de 2024 do Pintado. Jogar feio, fechar a casa e torcer para achar um gol.

Aliás, até para esse jogo pragmático (para não classificá-lo como feio) precisamos que pelo menos dois ou três atletas façam a diferença. Alex, Cauan e Tadeu, saiam da ideologia e olhem para o pragmatismo. Tudo isso considerando que precisamos de um camisa 10 carregando o time nos momentos mais complicados (Cristiano será esse salvador???), uma dupla de volantes que marque intensamente (Fernando Henrique e Matheus Nunes possuem essa intensidade???) e uma defesa segura (nossa linha defensiva estará exposta em todas as partidas???).

Ontem, no Allianz, mostramos um time apático, anêmico, bagunçado. Tudo isso sob uma gestão profissional e um maior investimento, comprovando que dinheiro não é tudo se não souber gastá-lo. Investimos mais para apostar nos remanescentes da Copa Paulista? Entramos em campo com Cristiano de camisa 10, Hudson de titular e, com 20 minutos de jogo, pensando que o Tauã era salvação no meio. Alguma coisa está errada!

Olhando para o nosso calendário nesse começo, jogando esse “futebolzinho” de série A2, ou pior, não jogando futebol, corremos um grande risco de chegar à sexta rodada contra o Botafogo, zerados em pontos. Pegaremos na sequência um forte Novorizontino em casa, duas viagens, contra Ponte e Mirassol, e encerramos o tour do corredor polonês enfrentando o São Paulo. Que belo começo, messieurs!

Por último, precisamos exaltar a participação da torcida rubro-verde. Único ponto positivo! Diferente do time, houve intensidade, vibração e alegria. Mesmo após os 2 a 0 não paramos de cantar, contrastando com a torcida de teatro de Perdizes. Foi uma linda festa para um time horrível. Para quem esperava que essa sina acabasse, sinto dizer, ela ainda permanece. O que nos resta perguntar é: Alex, que Heavy Metal é esse?

* Tiago Cabral, 33 anos, privilegiado por ter visto a última era de ouro da Portuguesa. Súdito de Capitão, cover fracassado de Clemer e o maior anticandinho do Pari. Corneteiro profissional com análises totalmente ácidas quando se trata da Lusa.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do NETLUSA


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