Tiago Cabral: A velha sina de lutar para não cair

SAF prometeu novo ânimo e entregou a velha sina da luta contra rebaixamento

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Foto: Mauro Horita/Ag. Paulistão

A transformação do futebol rubro-verde em SAF trouxe uma nova esperança ao torcedor. Todo sofrimento e desânimo davam sinais de que ficariam no passado. Os primeiros discursos, nitidamente inflados para atrair mídia, prometiam uma nova era no clube. Alex Bourgeois, CEO da Portuguesa SAF, falou aos quatro cantos do mundo que teríamos gestão profissional, modernização, elenco competitivo e filosofia de jogo.

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A escolha do treinador, as primeiras contratações e todo o papo furado de ideologia de jogo, já davam sinais que não se sustentariam. Aliás, dificilmente no futebol, qualquer discurso é bancado a longo prazo. O calendário apertado, a falta de tempo para treinamentos e a pressão são gatilhos para mudanças bruscas de ‘rota’ e para influenciar o ambiente.

O ajuste no calendário feito pela CBF, que antecipou o começo do campeonato estadual, aliado à tabela da Portuguesa, só reforçaram a ideia de que a dificuldade seria ainda maior. Nas cinco primeiras rodadas, enfrentamos três time de série A, um time de série B (que ano passado bateu na trave do acesso para o Brasileirão) e um time de série C fora de casa.

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Ter uma pontuação baixa a essa altura é normal pela tabela enfrentada. Porém isso não pode ser uma desculpa. A falta de perspectiva de melhoria assusta o torcedor. Passados 450 minutos de exibição, a Portuguesa não conseguiu manter 90 minutos regulares. Não consegue sustentar as vantagens construídas: em dois jogos, cedeu o empate e não dá sinais de que possa evoluir. Apresentamos o mesmo roteiro de 2023 e 2024, mas com uma campanha inferior (a pior desde o nosso retorno ao Paulistão).

Com uma folha salarial de dois milhões por mês, não construímos um padrão de jogo. Nosso gasto mensal é muito maior que anos anteriores, e superior a times como Guarani, São Bernardo e Noroeste, que até o momento mostraram-se melhores que o nosso. A sensação é de que tudo construído pela SAF foi em cima de um castelo de areia, que ruiu com a primeira ventania.

Analisando as escolhas da SAF no futebol, claramente há um erro de cálculo. Partiram do pressuposto arrogante que apenas dinheiro, por si só, faria o time melhorar e crescer organicamente. Submestimaram o poder da mídia que eles alavancaram (jogadores aproveitaram a injeção de capital para pedir salários maiores do que o esperado) e não fizeram a leitura do comportamento do mercado (times de série B e série C, de estaduais menores, conseguindo segurar seus atletas).

Destrinchando as principais escolhas, começamos pela questionável contratação do diretor esportivo, Tadeu Oliveira, cuja função, até agora, não está clara. Ele é um mero negociador ou ele decide quem será contratado? Apesar dos 20 anos de experiência no mercado esportivo, sendo grande parte como empresário de atleta, que conhecimento ele tem do mercado de série D e de times que lutam pela sobrevivência no Paulistão? É benéfico ao clube pagar dois milhões para ter um zagueiro na reserva? Investir outros dois milhões para trazer um perna de pau, que jogava na amadora segunda divisão austríaca, vale a pena? Tadeu, estamos esperando os jogadores de diversos níveis que você prometeu.

O segundo ponto questionável é a escolha do treinador. Cauan possui pouca experiência e muita soberba. Chegou com toda pompa de acadêmico, estudioso e que implementaria uma filosofia moderna. Mas que filosofia? A da Portuguesa perdida? Sem criatividade ofensiva, que circula a bola sem objetividade, com meio-campo sem combatividade e uma defesa exposta? Estamos longe da intensidade e da qualidade prometidas. Cabe a ele, a mesma reflexão feita ao diretor esportivo. Que conhecimento possui de times na mesma condição da Lusa?

O terceiro ponto questionável é a montagem do elenco. Nesse ponto específico, discordo de parte da torcida. Acredito que vários atletas desse elenco seriam titulares em anos anteriores (falta um treinador). Porém montamos um grupo muito jovem. Entendo que buscaram opções que pudessem dar um retorno financeiro ao clube, mas se esqueceram de contratar caras mais ‘cascudos’, experientes e que não sintam o peso de grandes jogos.

Fora a juventude do plantel, outro ponto preocupante é que vários desses atletas jogaram muito pouco em 2024. Chegaram em baixa por qual motivo? Avaliamos se é condição física? Estagnação do desenvolvimento? Scout só filtra base de atletas promissores até 2022 e 2023? O Paulistão é um campeonato de 12 rodadas que dura 45 dias. Você tem jogo quase toda quarta e domingo, precisa de um time com ritmo de jogo. Chegamos à sexta rodada com os atletas da Copa Paulista sendo titulares. Investimos mais para apostar nos remanescentes?

Alex, vou repetir o que disse na coluna anterior. Um time de série D, montado às pressas, que joga pela permanência na divisão, não permite tempo para utopias. Acrescento, não permite tempo nem para teimosias e insistências burras. Tenho plena certeza de que você não mudará sua concepção. Cauan ficará treinando o time e Tadeu será seu diretor, mas é importante enfatizar que errar é humano, insistir no erro é burrice. Você está cercado de incompetentes. Isso, se o incompentente não for você, que não consegue enxergar o óbvio. Ninguém em sã consciência cogitaria trazer Nani, que estava na reserva da Estrela Amadora. Ao invés de falar baboseiras na imprensa ‘vendendo terreno na lua’, gastaria esforços em trazer um centroavante decente, um treinador de verdade e montar um bom elenco.

Todo o lindo projeto da SAF, a subida até a série B, valorização da marca e toda essa baboseira que a turma do Itaim Bibi gosta de dizer, dependem da campanha no Paulistão. Uma queda para a série A2, colocaria tudo em risco e atrasaria os planos. Já pensou que podemos jogar a A2 no Pacaembu para 800, 900 pessoas? Que tragédia!

Meu caro CEO, largue a arrogância de lado. Assumir que errou, que subestimou alguém ou alguma situação, é uma das maiores virtudes do ser humano.  Você parece gostar de futebol, mas há uma diferença entre gostar e achar que entende. Se for para ter uma gestão que acha que entende, não precisamos de vocês. Estamos há 104 anos achando que entendemos algo.

Os próximos quatro jogos serão fundamentais para decretar nosso futuro. Precisamos de 10 pontos para não depender de milagres nas últimas três rodadas. O ideal seria chegar de ânimo renovado, com novo treinador e um diretor competente. Sabemos que a teimosia, a arrogância e a ideologia furada da SAF não farão que isso aconteça

O que nos resta é torcer pelo milagre. É rezar para que possamos comprovar cientificamente que um raio pode cair três vezes no mesmo lugar.

* Tiago Cabral, 33 anos, privilegiado por ter visto a última era de ouro da Portuguesa. Súdito de Capitão, cover fracassado de Clemer e o maior anticandinho do Pari. Corneteiro profissional com análises totalmente ácidas quando se trata da Lusa.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do NETLUSA


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