Foto: Vagner Magalhães

O Museu do Futebol foi palco de uma demonstração de amor da torcida da Portuguesa no último sábado. Uma exposição de colecionadores de camisas coloriu a entrada principal do Pacaembu de rubro-verde. Já o auditório Armando Nogueira, que fica embaixo das arquibancadas do estádio, recebeu mais de 300 lusitanos no evento “Lusa: passado, presente e futuro”. Foram quatro horas de resgate do passado, homenagens a ídolos e de um intenso debate em que torcedores, jornalistas e ex-jogadores tentaram encontrar soluções para tirar o clube da pior crise em 97 anos.

O evento começou com a exibição do filme “Rubro-Verde Espetacular”, seguida de uma homenagem ao ex-jogador Orestes. Ele foi atacante da Lusa na década de 1950, é um dos únicos remanescentes da época e fez parte dos times que conquistaram por três vezes a Fita Azul. Aos 88 anos, o ex-atleta recebeu um certificado de agradecimento do Acervo da Bola em nome da torcida pelas façanhas do período de ouro do clube. Orestes foi aplaudido de pé, agradeceu aos lusitanos e dedicou aos companheiros. Um momento de extrema emoção para os torcedores, que lotavam todas as poltronas.

Logo depois, os torcedores passaram a discutir a atual crise da Portuguesa e a refletir sobre quais são os caminhos para uma mudança de rumos. Falou-se do amadorismo das diretorias, da arcaica estrutura política, do ultrapassado estatuto do clube, da resistência em profissionalizar o departamento de futebol, dos desmandos nas categorias de base, dos impactos do “caso Héverton”, da sucessão de rebaixamentos, do risco de perder o Canindé e principalmente do que fazer para evitar o fim da Lusa. O bate-papo, porém, não ficou apenas focado nos problemas, mas em soluções.

Os poucos lugares que iam ficando vagos ao longo do debate eram rapidamente preenchidos por quem assistia em uma tela do lado de fora, a espera de uma poltrona para entrar no auditório. O debate foi mediado por Roberto Costa, apresentador do programa Paixão Lusa, da Rádio Trianon. O bate-papo contou com a presença de Badeco (capitão no título paulista de 1973), Julio Gomes (jornalista do portal UOL), Antonio Quintal (memorialista, apresentador do Paixão Lusa e colaborador do Museu Histórico da Portuguesa), Michelle Abílio (autora do livro “Boteco da Lusa”) e André Carlos Zorzi (autor do recém-lançado livro “Pra nós és sempre o time campeão – A Portuguesa no ano de 1996”).


Julio Gomes contou que o “caso Héverton” acabou o afastando um pouco do Canindé, já que ele jamais aceitou o fato de a Lusa não ter investigado com afinco, esclarecido e punido eventuais responsáveis. O jornalista destacou que a imagem da Portuguesa perante as outras torcidas, a mídia e os investidores está arranhada desde então. Ele defendeu a separação do clube social do futebol, com foco no esporte. Além de uma mudança radical na diretoria, com a saída daqueles que detêm o poder há anos e a entrada de pessoas novas, ou mesmo a chegada de profissionais de fora com conceitos modernos. Pontuou que a torcida já deixou claro que aceita até a terceirização do futebol.

Michelle Abílio seguiu o mesmo tom, ressaltando que até hoje não se conforma com a postura das diretorias da Portuguesa em relação ao “caso Héverton”. A autora do livro “Boteco da Lusa” destacou que as recentes gestões sempre pecaram pela falta de competência. A jornalista citou que nem mesmo a BarceLusa de 2011, com um time que encantou o país e resgatou a torcida às arquibancadas, foi aproveitada. Ela usou como exemplo o rebaixamento no Campeonato Paulista seguinte. Uma mostra de que os bons momentos podem ter sido “o pão caído com a menteiga para cima” mesmo.

André Carlos Zorzi abordou a interrupção de uma certa constância da Portuguesa ao longo da história, que a cada década conseguia ao menos disputar um título. O autor do livro sobre a Lusa de 1996 destacou que naquele elenco vice-campeão brasileiro havia, por exemplo, apenas um remanescente do título da Copa São Paulo de Futebol Júnior. A conclusão geral de quem estava no auditório foi de que a Rubro-Verde não sabe aproveitar os bons momentos há tempos. Hora em que os outros debatedores relembraram as polêmicas saídas de craques como Zé Roberto e Rodrigo Fabri.

Antonio Quintal focou bastante na condução do futebol. O apresentador do programa Paixão Lusa, da Rádio Trianon, falou sobre a contratação desenfreada de jogadores, a escolha com base na propaganda de empresários e a resistência em profissionalizar o departamento. O memorialista citou exemplos como os de Emerson Leão e Candinho, que acabaram saindo do clube alegando falta de autonomia para trabalhar. Que, em vez de gastar tanto com contratações erradas, as direções deveriam reconhecer incapacidade e deixar a condução do futebol nas mãos de quem é do ramo.

Badeco deu um depoimento emocionado, falando da tristeza em ver o clube com o qual se tornou campeão paulista em uma situação tão crítica. O capitão de 1973 disse que um dos fatores para a derrocada da Portuguesa foi justamente falhar na gestão das categorias de base. O ex-jogador afirmou que cada vez menos se procura profissionais para atuar na seleção e na preparação de jovens. E que falta à Lusa retomar o trabalho de dar aos elencos conhecer a história do clube, para respeita-la.

O debate contou com a participação de quem estava na plateia. Ivair, o “Príncipe do Futebol”, tomou a palavra em um dos momentos mais emocionantes do evento. Ele fez um desabafo sobre a revolta em ver a Portuguesa fora de qualquer divisão do futebol nacional. O ex-atacante disse que é preciso passar o passado recente a limpo, principalmente o “caso Héverton”, e deixar as vaidades que tomam conta dos poderes do clube de lado. Que, se nem no momento atual há um ato de grandeza para profissionalizar a diretoria, quando haverá? Ele fez um apelo para que a torcida se mobilize.

A parte final do debate teve como foco as mudanças. Foram diversas as sugestões para se profissionalizar a direção e modernizar a estrutura política do clube. Os torcedores cobraram transparência, principalmente em relação ao acordo para pagamento das dívidas trabalhistas e ao projeto de modernização do terreno do Canindé. A conclusão geral foi de que, se há salvação, está justamente na arquibancada. E que os próprios torcedores precisam encontrar um meio de transformar essa vontade de salvar o clube em mudanças concretas. Até de fora para dentro.

Os torcedores deixaram o Museu do Futebol discutindo o que pode ser feito para que a arquibancada faça a diferença. Houve até mesmo um reconhecimento de culpa por não ter agido antes contra diretorias incapazes de gerir o clube. O evento “Lusa: passado, presente e futuro” foi idealizado pelo Acervo da Bola (de Cristiano Fukuyama e Luiz Nascimento), organizado em parceria com o Museu Histórico da Portuguesa e com o apoio total do Museu do Futebol. Fica o agradecimento conjunto a todos os presentes. E a conclusão: podem até acabar com a Portuguesa, mas não será nas sombras.

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FONTEBlog do Torcedor

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