Ficou famosa a declaração do presidente da Portuguesa, Manuel da Conceição Ferreira, ao receber o título pela campanha irretocável em 2011. “O pão com manteiga caiu virado para cima”. A despeito do folclore e até de uma certa galhofa, a frase era assustadoramente reveladora de como o futebol é tradicionalmente administrado pelos lados do Canindé. Se os mandatários não sabem nem o que fazem de acerto, quanto mais fazer autocrítica para corrigir seus erros.

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Pois bem, basta uma retrospectiva dos últimos resultados da Portuguesa em competições para perceber que não tem nada a ver com sorte ou azar, cara ou coroa.


Em 2007, depois de um susto enorme, salvando-se da série C na última rodada na “Batalha da Ilha do Retiro”, a Portuguesa manteve o treinador Benazzi e parte do elenco. Isso sem falar de jovens jogadores surgindo da base, como o atacante Diogo e o meia Joãozinho. Impôs-se na série A-2, ficando com o título, e depois deu sequência no trabalho, mantendo treinador e fazendo contratações pontuais. Resultado: um surpreendente acesso, mas com consistência, construído tijolo por tijolo.

Em 2008, no Paulista, não houve salto de qualidade. Manteve-se quase o mesmo elenco e treinador. Ficou-se sem o Canindé também por várias rodadas – o que virou costume nos anos que viriam. Performance prejudicada e equipe cambaleante para iniciar o Brasileirão da série A, o primeiro desde 2002. O problema não foi ter demitido Benazzi, com prazo de validade vencido, mas não ter um plano de voo e passar a contratar a rodo jogadores e trazer dois treinadores que nada tinham a ver um com o outro – Valdir Espinoza e Estevam Soares. Resultado: rebaixamento.

Em 2009, a diretoria parecia acreditar no trabalho do técnico que caiu com o time, Estevam Soares. Em uma decisão surpreendente, manteve o profissional e deu a ele peças pontuais. O que aconteceu? Demissão após uma partida, esse foi o tamanho da convicção demonstrada. Entre idas, vindas e muitas trapalhadas (até um incidente no vestiário que foi parar nas páginas policiais), outros técnicos assumiram a Portuguesa, mas o resultado é que o pão com manteiga passou do ponto. Resultado: mais um ano na série B

Já em 2010, a receita foi mantida – Benazzi, que havia terminado o ano, ganhou uma nova chance. Montou o time à sua feição, mas não aguentou insucessos no Paulista e dava demonstrações claras de que seu futebol defensivista e voltado para o “motivacional” estava ultrapassado. Chegou o experimentado Vadão e suas mini-metas, que também não resistiu, dando lugar a Sergio Guedes, que terminou o ano, adivinhem? Sem o acesso, é claro.

No melhor ano recente da história da Portuguesa, Guedes iniciou o Paulista com muita irregularidade e suas indicações – lembram de Vandinho? – não emplacaram. Jorginho foi contratado para evitar o descenso no Paulista e montar o time da série B. Ou seja, reparem que finalmente em tantos anos finalmente um treinador teria tempo para montar o elenco que competiria na maior parte da temporada. Mesclou conhecidos, apostas e garotos da base. O resultado não foi simplesmente o pão com manteiga caído virado para cima, mas a recompensa de um árduo trabalho com começo, meio e fim. É fácil de entender para quem sabe que as coisas não caem do céu, ou da bancada de uma chapa.

Já em 2012, as coisas já começaram tortas. O time se desmanchou e Jorginho não teve a mesma capacidade de dar o salto de qualidade que se esperava – outra divisão, outra qualidade técnica e outro planejamento. Algo muito parecido com 2008 com Benazzi. A casa desmoronou e a Portuguesa caiu para a série A-2. De toda forma, o estrago foi dirimido por um planejamento para o Brasileirão. Foi contratado Geninho, que se hoje visse como os times da Portuguesa são montados jamais resumiria seu trabalho à troca de pneus com carro andando. Ele e Candinho montaram um time para permanecer na série A e cumpriram a missão.

No ano seguinte, o caos. Começou com 7 a 0 para o Comercial e acabou com a escalação de Héverton, que culminou em rebaixamento para a série B. No meio do caminho, Péricles Chamusca, Coronel Pimenta e Guto Ferreira, que deu padrão ao time, mas parece ter chegado tarde demais. Se tivéssemos um ano menos confuso, os pontos do STJD fariam diferença? Se as coisas não estivessem tão bagunçadas, o jogador suspenso seria escalado? O pão com manteiga, senhores, não explica.

Isso se seguiu em 2014, em que Argel conseguiu catar os cacos e manter o time na série A-1 do Paulista. Mas também tendo alguns reservas do ano anterior no elenco, como o meia Wanderson e o atacante Henrique. Assim que eles saíram, o pesadelo se iniciou na mais longa série B de todos os tempos. Dezenas de contratações, treinadores a granel e o pouco do passado de Benazzi sendo enterrado com uma campanha vexatória – 4 vitórias em 38 partidas.

O filme começou repetido em 2015, com mais uma baciada de contratações sem critério. Voltaram Edno e Ferdinando do time glorioso de 2011, mas só para se “queimarem” em um planejamento mambembe – o time é rebaixado para a série A-2, de onde ainda não conseguiu voltar e nem se sabe se um dia vai (as regras mudaram e as vagas para a elite paulista se tornaram mais limitadas, são apenas 16 em vez de 20 equipes). Uma nova direção assumiu, aparentemente fora do jogo bivalente da política da Portuguesa. Foi montada uma estratégia aparentemente coerente, com um técnico jovem para a série C. Tudo deu errado em quatro rodadas e o velho conhecido Estevam Soares voltou. Conseguiu se classificar, mas as inconsistências da montagem da equipe se tornaram flagrantes na hora da verdade. Sabemos que o pão com manteiga não teve nenhum papel na classificação do Vila Nova.

Agora 2016 surge como um resumo dos últimos anos da Portuguesa. O começo acreditando em Estevam Soares, demitido após o segundo jogo. A manutenção de um auxiliar-interino (assim como Pimenta), e a chegada de um treinador sem tempo de implantar um projeto, Ricardinho. Uma campanha amarga na série A-2, em que torcedores agradeceram aos céus por ter escapado de um rebaixamento, sinal claro de que o clube mudou de patamar. Depois, a manutenção de mais um interino sem experiência em equipes profissionais (Pimenta, parte III), Anderson Beraldo, que pediu o boné após tomar de 5 a 0 em casa para o Botinha de Ribeirão Preto (lembram do Comercial?).

Ou seja, fica clara à vocação do clube de cometer os mesmos erros – lembra do que falamos sobre como é importante aprender com eles? Como fazer isso se os dirigentes nem identificam no que acertaram, não é mesmo?

É claro que não demoraria para pensarem em uma solução do passado – desta vez Jorginho, com a reputação da Barcelusa ainda na memória afetiva dos torcedores, é a bola da vez. Será que desintegrará sua reputação a serviço da falta de planejamento, repetindo a saga triste de Benazzi? Tomara que não. Mas a verdade é que até para passar manteiga em um pãozinho é preciso algum planejamento: escolher uma faca, cortar precisamente e untar com cuidado o miolo. Só que mais uma vez a Portuguesa decidiu transformar sua vida em uma roleta de cassino. E todo mundo sabe que a banca sempre ganha quando você transforma sua vida em um jogo de azar.

Por Luís Alberto Nogueira

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